Deslizamento
sec/baveux
A ponta Digo isso por dizer Romano Romeno Rohmer Cobra A ligação entre as pessoas como lenços Não me pergunte o nome É babenta O tronco seco Olhos que vêm e vão Mulher Não mas eu quero ainda Vejo Um poeta inglês que mal conheço Entra sem permissão Rua trilhos cheiro de trem Volta em duas paradas O que aconteceu Não vê que não consigo me ver Pois porque Porto A volta Os desvios a saída a grande rotatória Gaveta giratória Eisenhower nome Eu me encaixo como um grampeador Onde estão os cachorros Expressa espreme exprime Na grama Eu fico do lado dos prazeres Onde mesmo feia A vulgaridade Obsessão ácida amarga que me suga tem mais conteúdo Do que a história da historiografia A transcrição como pontos Sem … | La pointe Je Romain Roumain Rohmer Serpent Les liens entre les gens comme des foulards de magicien Ne me demande pas le nom correct de l’arbre qui me manque le plus Il est baveux Le tronc sec Des yeux qui vont et viennent Femme à contradictions Non mais je veux encore Je vois ses pieds mais pas ses mains Un poète anglais que je connais à peine Entre sans permission Rue rails odeur de train Retour en deux arrêts Que s’est-il passé Ne vois-tu pas que je ne me vois pas Puis pourquoi Porto Le retour en vélo rapide Les détours la sortie le grand rond point Tiroir giratoire Eisenhower nom Je m’attache comme une agrafeuse Les chiens où sont-ils Expresse exprime presse Sur l’herbe Je reste du côté des plaisirs Où même laide La vulgarité Obsession acide amère qui me gâche a plus de contenu Que l’histoire de l’historiographie La transcription comme des points Sans … |
a gente
Bolhas de pretensão consumem meu ar humano…
Estampas baratas, roupas gelatinosas,
Frases perdidas, outdoors expectorantes.
Vistas assim, de longe, são belas como medusas,
Algumas estão próximas de mim e me vêem.
olhar muro
Seus olhos são muros,
Mais fortes que os meus.
Seus olhos são paredes,
Os meus são só móveis
(gavetas sem chaves)
empoeirados,
enegrecidos.
wasseraugen
Margem chegando (medusesca). Espuma e músculos como frutas cristalizadas.
Hora de voltar à vida terrestre, de(s)mergulhar na calmaria triste (sem salvação).
sarah
Que importa errar, se é só em palavras?… Os olhos de demônio da enfermeira (simpatia erótica).
“Vou compensar tua espera” diz ela. Mas é impossível: aqui tudo é perda de tempo e dinheiro, como tinta de cabelo e absorvente.
“Não estás doente, mas poderias estar”. Aos atenciosos de plantão, nos desnudamos. Basta pedirem.
Nu e saudável, ando pelos corredores. O medo dos outros como num desfile de carnaval.
Vozes tremidas,
Dores talentosas,
Rotinas telefônicas.
jaz
Velhas estruturas emergem, nos
Suspendendo feito paletós surrados.
O gosto amargo dos corpos, a falta absoluta;
“Aqui jaz, velho soldado” (função, ganho, mulheres).
naturkultur
Nuvem azul: algodão doce.
Verde triste: chorona.
Robô gigante, motorista: rua, carro,
Sprinkler.
inbox
Mulher, fumando na escada
em dia quente. Abafada,
Tediosamente enclausurada.
tremor
Gotas formando, através do vidro, pequeno rio diagonal.
Mais forte, esse riozinho, que mil parafusos
Na asa mecânica.
Meu sono metálico, mais fraco que a língua d’água
Serpenteando mecânica (nauseante),
Náusea tremida.
…
viejo
Histórias de carro e dor, motor, dedos cortados;
Dores de cabeça noturnas, noites sufocadas,
Acabam passando, sem mudar
Hábitos solares.
não é um sonho (ii)
Asfalto granular,
Sol planando no horizonte,
Olhos de cão;
Soa falsa, nesse horizonte, qualquer direção.
Sou falso
Ainda.
juni
O vento glacial toma conta, tornando o verde cinza.
O céu como sala de espera do cotidiano
Cortando aos poucos (hoje muito).
wor.l.d making (diário)
Não deveria ser assim (mas é): Bustos heráldicos em uniformes (Lourdes, Cynthias e Fátimas); rostos jovens com 30kg (100g nas orelhas); aleijados atravessando a rua como soldados (com a ajuda das mães), para verem médicos ou advogados (casos perdidos); pássaro de asa quebrada, como pedinte na rua, entre carros, desafiando o mundo-real.
…
wi.n.dow
A história desta janela é suave, porque esquecida.
Olhar a vida por ela, é como misturar ferro e vidro.
gaufre
Raiva e distração queimando milhões de lares
Ao sol da manhã.
…
Risos de criança e peles de cobra,
Lado a lado sobre a mesa.
…
falso rio
Indecisão de dia de chuva…
Devemos abrir? Funcionar? Expor?
Dúzias de ovos, quilos de farinha, bananas
Trocadas com um aceno de cérebro.
Compensação, alegria de continuar
Fingindo.
macumba (ii)
Passo por eles quase sem perceber. Dormindo na pedra, abraçados, são o que são: amantes animais, sem beleza, nem vergonha. Amor como anestesia das aparências.
dresde.n.er (diário)
Por dois dias nas ruas de uma ex-cidade: amanhã tudo começará a desfazer-se: semana, mês, ano. Hoje é possível, ainda, estar lá e cá, ordenar o tempo como quem destrói paisagens, escolhendo folhas, mudando-as de lugar. Mas logo virão os cascos policiais, os suores supersticiosos, anunciando o velho mar (abstrato) e o peso vivo das ondas.
mesmologia
O que escrever desse dia? (si normal de loin)
Guarda-sóis esquecidos, “estrelas sem brilho”,
Minha tristeza, de novo? (tout de même)
Como dizer, sem dizer, o-de-sempre…?
neukölln (diário)
Nessa cidade o presente é invisível. Saber que já foi duas e hoje é uma só… É como andar sobre chão cicatrizado, sentindo ainda a dor, ou a lembrança da dor concentrada. Diferente da época em que, dos terraços vizinhos ao muro, as pessoas saltavam sabendo que podiam morrer (li isso numa placa). Tinham, ou imaginavam ter do outro lado alguém para cuidar delas; depois. Ficar inteiro sozinho, de que adianta? Estou oscilando com tanta força, aqui, entre alegria e tristeza, que é difícil pensar que a cidade não tem parte nisso. Me dói a distância do meu país, me doem os olhos na tela do telefone, e uma coisa se mistura com a outra… Vocês (meus amores,) são meus telhados onde vivo me jogando. Preciso descobrir o que é esse muro e se preciso usar óculos.
corredor
Corro entre gentes de mármore, e máscaras de ex-escravos, certo de que um destino trágico me espera… Dieu, merci !
plástica branca
No rosto de cinco anos
A matéria plástica que se transforma,
Racha, sem desmoronar.
A lâmina delicada fervendo sob a pele:
Sadismo saudável, sem amarras.
…
Sol: genocida celular, que mata aos poucos, por capricho,
Eus-mesmos que amam se exterminar.
meu “se” (diário)
Medo que não aconteça o que não pode acontecer. Medo de perder, mais uma vez, o que ainda está pedindo socorro. Posso tocar mas não ver (estou perdido?). No fim, tudo deve ser tão simples. (Mas não é ainda). Morro esperando o que virá, mas não para mim. (Certeza).
macumba (i)
Quando a verdade é
Mentira bem contada ou
Raiva mal escolhida,
Vem a idéia do acaso, me salvar
Dos cascos marciais; crânios
Traumáticos, marcianos, semíticos, de
Mulas sem cabeça.
Riscos na lama, curvas livres,
Turvam meus sentidos num falso mar de estridência.
eichendorff (à malakoff)
Platô da normalidade (minha janela de manhã).
Pinheiros balançando como cachorros molhados,
Calhas vomitando em batentes, línguas de minuto,
Postes que se apagam em luzes frias,
Mal obedecendo, como crianças autistas.
Um pássaro azul chega se partindo —
Mancha laminada em laranja formigando.
Gestos emplumados, máscaras rituais,
Adolescentes se provocando (sabem que não posso descer?)
infância
2 adultos barrando a transparência,
Chuva batendo na janela
(volte a dormir).
2 sombras de vidro
Cortantes para sempre.
detektiv-roman
Era como um daqueles ratos de metrô, destruidor de flores, sem nenhuma dúvida.
(Apenas essa: qual o próximo buraco que escolherá?)
pound’s pond
Afundo ao som de bolhas metálicas,
Isolado do frio (te pego lá fora).
Meu livro de 30centavos com dentes rachados
e flechadas-de-ausência, lido, mecanicamente.
Gentes são bilhas;
Mudismos, imundície.
les chanceux
Dix minutes d’avance il pleut dehors
Déjà à l’intérieur je me dis
Il reste du temps pour ceux qui seront en retard
plancton
Lembro bem do meu personagem,
Cada peça num tom de verde…
Vem daí o Meu-Verde?
ângulo bruto
Meu nome, que infalivelmente inflama-se,
Corta e sutura, quase nunca o digo.
Fora os dias adoentados,
A nevrose clássica,
Os gozos inúteis;
Sobrœu
sismologia
Pele sobre pele.
Flácidas, retesadas.
Como se sustentam,
Quem as suporta?
A própria angústia, me parece
Mal menor,
Natural.
Afinal, que é o choque,
Diante do ser-feito-em-placas?
3 a.m. (diário)
Dizem “uma ou outra”. Eu vejo três em uma. 3 arquiteturas-modernam: Arquitetura-lápide, em pó. Caixões brancos que valem o peso em ouro. Arquitetura-luxo. De brotoejas vitrais, inveja e auto-ajuda. E arquitetura livre de teoria. De unha roída; açucarada; santíssima feiúra.
parisiense
Madame na janela,
esquecida em simetria : Velha imagem da vitória
rio antigo
O nariz diz mais
que o olhar (mentiroso),
que o corpo , (estático)
que o cigarro (fumaça).
Nele, o ar se mistura
A sentimentos de ferro.
curva do morro
Daquele campo conheço, cada grama,
Cada mato.
No alto, a igreja caiada, favela vazia
Serpenteando imóvel, morro abaixo;
E a cerca aramada que nos protegeu
Do beijo, do horror.
Crioulos do mato,
Tijolos s/ dono,
Pich/dor/asfalt
mendigo (ii)
Não sou daqui, a mim é permitido
Deixar meus rastros pelo caminho,
Me impregnar do velho sol e
Ao acordar, escolher o sonho.
Vivo entre jornais, recortado, por isso
É meu direito, querer mais dos que passam.
Virado na calçada,
Não sou daqui,
Escolho o sonho.
filosofia da arte
Onde a filosofia busca o quê, a arte mostra o quando. E
se a filosofia mata o quando, pra arte não importa o quê.
saint-rémy
Dentro são ossos, carne e entranhas estiradas
Respiro em seus órgãos mas nada hei de levar
O toráx do Cristo me protege até a chuva passar
bsb-ory
Sob a grossa camada azul –celeste–
Nuvens como espuma marítima.
Abaixo, mergulho em outra vida.
verde-pardo
Esse olhar, esse mover-se de sonho:
Ganhos das horas perdidas
Das noites de insônia.
modo espera
Curvas fechadas feitas em paz,
Telhas dobrando, telhados de barro
Árvores, vento, teclas de piano
(as cercas não importam).
heliotrópico (ii)
Vivendo em regiões colonizadas, em casas de papelão;
Aqui, onde as árvores crescem como pêlos grossos,
formando sombras de exceção. Mesmo o azul do céu
Não é confiável.
grifo
Olho para o céu na esperança de certeza: “Nada mudou.”
Mas a grade e o vidro nos afastam (é preciso tocar para ser),
E nosso olhar, pouco a pouco,
Nos deixa.
heliotrópico (i)
Quadro amarelo brilhante num dia ensolarado.
Tristesse, grã-tristesse. . .
egofamiliar, ecopoético
pai:
Eu acordo junto com a geladeira.
O carro lá fora fez cocô…?
E quando o médico fica doente?…
mariana
Vida de escrava liberta que, sem ter aonde ir,
Morreu com seu regador entre as flores
Dos netos de seus senhores.
fenomenologia
Gotas (asc)descend(entes) do chuveiro tocam meu rosto num presente contínuo…
sharpener
When we realize, the pointlessness of life, we get disappointed.